12 de janeiro de 2021 ESPANHA

Os maristas da Catalunha agradecem a coragem das vítimas de abusos

Em janeiro de 2020, os Irmãos Maristas da Catalunha, Província de L’Hermitage, firmaram um convênio com a associação “Mans Petites” para a criação de uma comissão responsável pela avaliação de casos de abusos em escolas maristas. A Comissão de acolhimento de vítimas de abuso sexual de casos prescritos, financiada pelos Maristas, analisou 25 casos e anunciou suas conclusões no dia 10 de dezembro, em Barcelona (ver detalhes no vídeo).

Motivados pela convicção afirmada no último Capítulo Geral de que “os abusos vão totalmente contra os nossos valores maristas e minam o próprio objetivo do nosso Instituto”, os Irmãos agradecem às vítimas pela coragem que demonstraram ao dirigir-se aos membros da Comissão e expressar com palavras o que vivenciaram. Os maristas consideram que se trata de um processo voltado para a reparação e, por isso, é essencial dar credibilidade às palavras das vítimas e reconhecê-las em sua dignidade. Responder às vítimas de abuso sexual prescrito é um dever moral.

Publicadas as conclusões, os Irmãos Pere Ferré, Provincial, e Gabriel Villa-Real, Delegado Provincial para a proteção das crianças, publicaram a nota que transcrevemos a seguir.


A coragem da palavra a serviço da verdade

Uma vez tornadas públicas as conclusões da Comissão para o acolhimento de vítimas de abuso sexual em casos prescritos, promovida pelos Irmãos Maristas e pela Associação “Mans Petites”, gostaríamos de explicar o contexto e apresentar nossa reflexão.

A Comissão Independente: escuta e reconhecimento

A Comissão foi constituída em 30 de janeiro de 2020 e nasceu de um acordo entre os Irmãos Maristas e a associação “Mans Petites” para cuidar de pessoas que não puderam ir ao tribunal porque o caso que relatavam estava prescrito. O objetivo da Comissão era avaliar a plausibilidade dos fatos relatados, avaliar os danos psicológicos e as sequelas das pessoas acolhidas, coletar as informações por elas fornecidas e estabelecer, se necessário, uma compensação financeira por essas sequelas.

Os membros da Comissão são profissionais independentes, especialistas no atendimento às vítimas de violência sexual entre crianças e adolescentes, de reconhecido prestígio: Senhor Xavier Puigdollers, advogado, Sra. M. Dolors Petitbò, psicóloga, e Sra. Montserrat Bravo, psicóloga.

A Comissão recebeu 25 pessoas. As entrevistas aconteceram nos meses de março, julho e setembro de 2020. O trabalho da Comissão não foi um processo judicial, não houve investigação ou julgamento e, portanto, não houve condenações ou acusação. O objetivo era ouvir e reconhecer as vítimas.

Prescrição legal não significa esquecimento ou perda da responsabilidade moral

No contexto espanhol, nem o sistema judiciário, nem as estruturas sociais ou da própria Igreja dispõem de mecanismos suficientes para tratar as vítimas de casos prescritos e dar respostas globais. Em nossa opinião, a prescrição legal não equivale ao esquecimento ou perda da responsabilidade moral. Era necessário criar um espaço de escuta para as pessoas que não puderam ir ao tribunal por causa do prazo prescrito, que era o caso.

As vítimas no centro

As vítimas são a prioridade, é urgente ouvi-las e reconhecê-las. Assumir a responsabilidade institucional significa também assumir a sua história (com a sua riqueza e pobreza), mesmo se desaprovamos certas formas de fazer, de não fazer ou de não saber fazer. A existência das vítimas nos lembra que falhamos como instituição. Quando o olhar está voltado para as vítimas de abuso e elas são colocadas no centro de nossa atenção, chegamos à perspectiva relevante que revela o sofrimento infligido. Se fomos a parte substancial do problema, devemos assumir a tarefa de ser parte da solução após um reconhecimento sincero e sem astúcia.

A coragem da palavra a serviço da verdade

O objetivo era dar voz às vítimas e dar credibilidade a essa palavra. É um processo orientado para a reparação; por isso, era essencial reconhecer as vítimas na sua dignidade. A Comissão, enquanto terceiro, como pessoa neutra, permitiu que a palavra fosse dita e ouvida. As pessoas que compareceram à Comissão foram recebidas por profissionais da área de psicologia, com experiência em casos deste tipo. Reconhecemos a coragem das vítimas em compartilhar sua experiência. Também reconhecemos a dor e o sofrimento que algumas pessoas lhes causaram no âmbito da instituição marista. Portanto, reconhecemos que falhamos para com elas.

A Comissão estabeleceu as resoluções numa base individual. Cada uma das 25 pessoas acolhidas recebeu, além da avaliação da Comissão, uma carta assinada pelo Irmão Provincial dos Irmãos Maristas e pelo Delegado Provincial para a Proteção da Criança. Nessa carta, expressamos o reconhecimento da instituição às vítimas e a disponibilidade para encontrá-las pessoalmente, se assim o desejarem.

Perspectiva de reparação

Abordar a escuta e o reconhecimento das vítimas na perspectiva da reparação significa reconhecer os fatos e a própria pessoa como vítima; reconhecer e assumir as responsabilidades que daí recorrem; reconhecer que falhamos como instituição e pedir perdão e, finalmente, criar os meios necessários para evitar que eventos semelhantes voltem a acontecer.

A Comissão cuidava para que a reparação econômica fosse um processo transparente e não pudesse ser interpretada como uma mera transação econômica destinada a resolver o problema nos bastidores, o mais rapidamente possível.

Reparar individualmente, após um processo de escuta, permite que cada história seja valorizada e que cada itinerário pessoal seja levado em consideração.

Uma mudança de cultura institucional: o que aprendemos e o que fazemos para evitar que aconteça novamente

Desde muito tempo, empreendemos uma mudança de cultura institucional. Há anos que as escolas maristas trabalham especificamente com os direitos das crianças e, desde 2009, celebramos o aniversário da Convenção, a cada 20 de novembro, na rede. Em 2011, o Instituto dos Irmãos Maristas convocou todas as Províncias a se equiparem com as ferramentas para garantir a proteção das crianças e dos jovens. A Província Marista de L’Hermitage (à qual pertence a Catalunha) aprovou, em 2013, uma política e um protocolo que se encontram no Guia para a Proteção da Infância.

As políticas e protocolos de proteção e prevenção visam, entre outras coisas, criar ambientes seguros, sabendo que não existe segurança 100% em nenhum lugar. Nesse contexto, atuamos de forma proativa para promover, prevenir e proteger as crianças e os adolescentes. Dados dos últimos anos mostram que o trabalho de prevenção está dando frutos. Cada vez com mais frequência, crianças e adolescentes denunciam situações de abuso, a maioria delas dentro da família. Do ponto de vista dos direitos, privilegiamos as ferramentas e recursos necessários para torná-los autônomos.

As escolas e obras sociais maristas, também há alguns anos, trabalham em programas educacionais adaptados a todas as idades, para oferecer às crianças e aos jovens os conhecimentos e a sensibilização apropriados a fim de que eles possam explicar e denunciar qualquer situação de abuso. A campanha “Briser le silence” ajuda a aumentar essa consciência. Educadores de obras educacionais maristas recebem treinamento especializado em proteção da infância. Divulgamos nossa Política Institucional de Proteção da Infância no site maristes.cat e em diversas publicações. No mesmo site, há um canal de escuta para esclarecimentos, sugestões ou dúvidas. As obras educativas maristas na Catalunha estão em processo para obter uma dupla certificação em proteção das crianças de duas entidades internacionalmente reconhecidas: o UNICEF (reconhecimento) e o Keeping Children (certificação).

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Ir. Pere Ferré – Provincial de L’Hermitage
Ir. Gabriel Villa-Real – Delegado Provincial para a Proteção da Infância
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Barcelona, 10 de dezembro de 2020

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