6 de maio de 2011 ESPANHA

Por que vou à prisão?

“Quero convidá-lo para uma sessão de homenagem que terá lugar, no próximo dia 19 de março, na subdelegação do Governo. Será um reconhecimento pelo trabalho que realiza no Centro Penitenciário de Villanubla e ser-lhe-á entregue um diploma de reconhecimento.” (Cecilio Vadillo, Subdelegado do Governo).

Respondi com algumas palavras de agradecimento e, principalmente, à pergunta que me faziam sobre o porquê de minha atividade de voluntário, no cárcere. Estas foram as minhas palavras:

 

“Sou um Irmão Marista aposentado. Ontem, precisamente, completei 81 anos. Faz quatro anos que deixei de lecionar no colégio que temos, à rua Joaquín Velasco. Desde então, dedico parte de meu tempo, como voluntário, aos internos do Centro Penitenciário de Villanubla.

 

Por que eu trabalho na prisão?

Na porta de ferro da entrada do meu colégio, há um pensamento de nosso Fundador, São Marcelino Champagnat, que diz assim: “Para bem educar um menino é preciso amá-lo”.

Poderíamos ter colocado outro pensamento, também dele: “Educar é formar bons cristãos e honrados cidadãos”.

Por ocasião de minha aposentadoria, disse a mim mesmo: procura, fora do colégio, algo em que possas ser útil à sociedade marginalizada.

Procurei aqui na cidade. Encontrei vários lugares. Por fim, optei pelo Centro Penitenciário. Aos internos de Villanubla dou:

– meu tempo e minha presença (fazendo com que esqueçam, por algumas horas, a rotina carcerária);

– minha vizinhança e minha companhia (porque, se um dia, eu cometesse um delito, gostaria que alguma mão amiga me ajudasse e me visitasse);

– minha amizade e meu carinho (partilhando simplesmente suas alegrias e suas penas, durante as nove horas em que estou com eles, ao longo da semana);

– na aula de pintura que dou a eles (falamos, comentamos, eles ficam felizes e eu me sinto bem, porque o faço com carinho e procuro criar esperanças);

– na aula, não sei o que aprendem de minhas lições, mas, a mim ajudam-me a ser mais humano, respeitoso e compassivo com os erros alheios.

 

Na quinta-feira passada, dizia-me um dos meus alunos: “Sr. José, sofro em estar aqui na prisão, mas quero ser uma pessoa digna e pacífica, ainda que esteja preso. O silêncio da cela (barraco, dizia ele) fez-me pensar e refletir muito. Eu quero mudar”.

É muito gratificante ouvir isso de um preso.

Se ajudasse a um só encarcerado a viver com esperança e com ilusão seus dias de prisão, dar-me-ia por satisfeito.

 

Alguém de vocês conhece uma pessoa que vá prazerosamente à cadeia? Eu sim. (E termino)

“O homem bom que passou fazendo o bem a todos, e principalmente aos excluídos e marginalizados de seu tempo, se chama Jesus de Nazaré; ele nos disse… Tive fome e me destes de comer. Fui forasteiro e me acolhestes. Estive na prisão e viestes visitar-me. E Jesus termina dizendo: O que tiverdes feito a um desses meus humildes irmãos, a mim o fizestes.

Eu creio, e por isso comprometo-me com eles.” Disse.

Foi um ato muito simples, mas muito emocionante. Agradeço a presença do Ir. Fernando Sánchez. Obrigado, Fernando.

Em nível mais familiar, acrescentarei: O que faço eu na prisão?

– Os primeiros dias foram duros, muito duros. Não sabia onde me havia metido. Tinha a impressão de que a cadeia me vinha por cima. Ia com todos os preconceitos das pessoas da rua.

– Nas terças e quintas-feiras dou aula de desenho e pintura, das 9h30 até 13h.

 

Nos domingos, acompanho o capelão nas três missas celebradas em diversos módulos. No cárcere há nove.

– Tenho alunos de 21 a 65 anos. São de diversas nacionalidades e cores, cumprindo condenações por erros ou crimes os mais diversos. Sempre tive etarras em classe. No ano passado, tive oito. Um deles concluiu seus sete anos de condenação, em maio último. Ao despedir-se, deu-me um livro com a seguinte dedicatória: “Ao Sr. José, meu bom professor e melhor amigo”. Neste Natal felicitou-me com um cartão pintado por ele.

– Às vezes criam seus temas. A um que fazia uma grande mancha negra no centro da pintura em forma de estranho fantasma, e quatro cruzes vermelhas, perguntei pelo significado. Respondeu-me: “São as quatro pessoas que matei e que carrego em meus ombros como um peso insuportável”.

– Interrompemos a aula para que entre o funcionário e acompanhe os alunos para tomarem a dose diária de metadona.

– O Centro Penitenciário situa-se a 14 km da cidade. Leva-me um jesuíta que trabalha na pastoral social e quando não pode, leva-me o Ir. Angel del Río. Obrigado, mais uma vez, Angelín.

– Há presos com os mais variados estados de ânimo: uns transpiram ódio, desespero, angústia, solidão porque ninguém os quer nem visita… mas em todos há um grãozinho de bondade e de bons sentimentos. Faço o possível para que aflorem. Entrego-lhes a folha de J. A. Pagola, comentando o evangelho de cada domingo. Aconselho-os a escreverem, no verso da folha em branco, o que a leitura lhes sugeriu. Tantas horas, sozinho no ‘barraco’, dão espaço para tudo.

 “Tenho quatro filhos, peço-te, Jesus, que não venham parar, como eu, aqui no cárcere. Faze com que sejam bons”, escrevia um deles na folha.

Com um abraço de irmão e amigo.

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H. José Santamarta Castro – Valladolid, España
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