Mensagem de Páscua do Ir. Seán Sammon, Superior Geral

25/03/2008

Irmãos, já se perguntaram, alguma vez, o que se passava no coração e na mente de Maria de Nazaré, naquela manhã do primeiro domingo de nossa Páscoa? Que pensamentos confrontava, o que sentia, quando finalmente, se cumpriam os acontecimentos daquela semana tão marcante da história? Com total certeza, sua missão e sua intuição como Mãe de Jesus, encerram uma lição para todos nós, aqui reunidos, nesta noite. Não apenas uma lição, mas também -assim o esperamos- algumas propostas de ação que poderemos desenvolver, a fim de transformar em vida a poderosa mensagem contida nesta festa solene.

Para começar, digamos que Jesus Cristo, com sua peregrinação pascal, redefiniu para sempre o significado da condição de ser membro da comunidade dos discípulos. E realizou-o desafiando a todos aqueles que formavam o mundo exclusivista da antiga Palestina – e hoje a todos nós – a renunciar às idéias convencionais de tribo e parentesco para abraçar homens e mulheres com igualdade; demolir os muros de separação, por outros erguidos, para separar gentios e judeus, ricos e pobres, pecadores e santos. Mais ainda, sua morte, resssurreição e ascensão devem encorajar a todos nós a proclamar uma nova lei, viva em nossos corações. Desse modo, para reivindicar a condição de membros vivos da comunidade de fé, será verdadeiramente necessário amar e agir, em nome do Reino de Deus; não bastarão mais simples laços de sangue.

Desde que Jesus começou sua vida pública, sabemos da preocupação que Maria tinha por Ele e por sua segurança. A tal ponto chegava esse desvelo que, segundo a narrativa do evangelista Marcos, Ela e os irmãos de Jesus foram procurá-Lo, com a intenção de trazê-Lo para casa. Maria tinha muitas razões para estar preocupada. Afinal de contas, Jesus percorria cidades e vilas, pregando, ensinando e criando inquietudes. Assim procedendo, Jesus colocava a si e a seus familiares em sério perigo de vingança, da parte das autoridades judaicas e das forças de ocupação romanas. A repressão poderia ser dura. O historiador Josefo recorda-nos que, por ocasião do levante que seguiu a morte de Herodes, dois mil judeus morreram crucificados e seus familiares foram vendidos como escravos.

Quando foram ao encontro de Jesus, Maria e os que com ela estavam deviam sentir-se um tanto desconsiderados. Jesus, informado de que seus parentes estavam aí, perto do local em que pregava, percorreu com seu olhar a todos os que estavam sentados em derredor, acolheu-os com o olhar e com palavras, qual verdadeira família de Deus, até mais autêntica do que aquela constituída pelos laços de sangue.

O anúncio da Boa-nova conduziu Jesus à prisão, ao julgamento e à condenação à morte. Mesmo que, durantes séculos, os artistas se tenham dedicado a captar a indefinível tristeza de Maria, ao pé da cruz, nem Marcos, nem Mateus, nem Lucas falam de sua presença, ali. João, pelo contrário, não apenas coloca, expressamente, Maria no Calvário, mas também a si mesmo. E o faz por uma razão importante, a saber, a de assinalar o nascimento de uma nova família de fé, fundada no seguimento de Jesus e de seu Deus generoso. Mais uma vez, Jesus está interpretando a família em termos de discipulado. Há um vínculo claro entre a morte do Senhor, o dom do Espírito e a fundação da comunidade cristã. O amor recíproco e a igualdade entre seus membros devem ser o distintivo da Igreja, quando Jesus não mais estiver aqui. Neste sentido, Maria é nosso melhor exemplo; ela é a primeira discípula e testemunha apostólica.

Entretanto, Maria ensina-nos outra importante lição pascal. Com a morte de Jesus, ela se uniu para sempre a essa comunidade de mulheres que, ao longo da história, experimentaram e experimentam o sofrimento singular de ver morrer seus filhos. Nesta noite, ao meditar nesta circunstância, não posso deixar de pensar nas mães de Alex, Philippe, Gaspar, Servando, Moisés, Chris e muitos outros. Sim, porque além de tudo, a morte veio marcada pela violência e permanece uma dor profunda para toda a vida.

A crucifixão, uma forma de matar particularmente cruel, era reservada pelos romanos aos escravos e estrangeiros. A morte de Jesus uniu assim, e para sempre, Maria àquelas mulheres que, através dos séculos, viram como seus filhos queridos, gestados, dados à luz, criados e educados, foram mortos pela violência institucionalizada, seja na guerra e na execução pública, seja na indiferença que tantos demonstramos frente àqueles que se encontram abandonados. Com a morte de Jesus, Maria uniu-se às mães e avós da Praça de Maio, na Argentina, que continuam a perguntar pelo destino que tiveram seus entes queridos desaparecidos. Ela se solidariza com as mães sobreviventes dos genocídios do Ruanda e do Camboja. Com as mães cujos filhos morrem nas guerras civis, ou são justiçados nos Estados Unidos e em outras partes do mundo, ou que encontram seu fim em mãos dos torturadores e daqueles que não têm nenhum respeito pela vida humana.

Se quisermos marcar verdadeiramente esta Páscoa, juntemos nossas vozes com a do Papa Paulo VI que, há anos, lançou o grito ?guerra, nunca mais?. Lutemos contra a cobiça que provoca tanta injustiça, em nossas sociedades, assim como a impotência e o desespero que conduzem ao crime. Sim, comprometamo-nos em não deixar morrer os filhos de outrem e rezemos para que nos seja concedido chegar a ser, junto com eles, verdadeiros discípulos de Jesus, membros da comunidade de fé, nova família do Senhor.

Feliz Páscoa!

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