2023-06-28 BOLIVIA

Experiência de imersão no interior do estado de Cochabamba (Ir. Inacio Etges)

O Ir. Inacio Nestor Etges, da Provincia Brasil Sul-Amazônia, desde o início do ano é da equipe de formação que acompanha os noviços da Região América Sul no noviciado de Cochabamba. No texto abaixo, conta uma experiência de imersão no interior da Bolívia, feita com noviços de diversas congregações, durante uma peregrinação ao Santuário de Nossa Senhora da Assunção, em Quiriria.

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Olha só! Ontem estive fora de CBBA a uns 120km, bem no interior da Bolívia, numa comunidade cristã chamada de QUIRIRIA, fundada em 1912, no meio de montanhas e geografia típica da Cordilheira dos Andes. Lá fomos nós 13 pessoas do curso de segundo ciclo do Noviciado Intercongregacional para a celebração do encerramento do primeiro semestre de 2023 no pequeno santuário de N.S. da Assunção.

A eucaristia foi presidida pelo padre Justino, esculápio, pároco de Anzalzano, pequeno município, o mais próximo desta comunidade. Esta paróquia é composta por 120 comunidades, entre as quais a capela e santuário de QUIRIRIA. Dizia-nos Pe. Justino, todas as 120 comunidades do interior que eles atendem estão em situação similar à de QUIRIRIA.

O acesso via rodovia é de estrada de chão batido, estreita, íngreme, muita poeira, sucessão de curvas e ribanceiras; olhando para um lado é barranco e montanha; olhando para o lado oposto, é ribanceira com vales profundos. Ao longo de todo trajeto entre as montanhas, vimos muitas casas em ruínas. Pequenas aldeias totalmente abandonadas e as casas todas em ruínas. Casas construídas com tijolos feitos de barro e secados pelo calor do sol. Uma vez secos, sem passar por fornos de olarias, já são utilizados para construir as casas.

Para chegar em QUIRIRIA, é um subir e descer montanhas. Chega-se a 3.300 metros de altitude no ponto mais elevado, para finalmente chegar no vale de QUIRIRIA onde encontramos a comunidade que se situa a uns 2.900m.

Esta pequena aldeia é composta por descendentes dos povos ancestrais indígenas. Ali, não há sinal nem de internet e nem de celular.

Conheci a verdadeira Bolívia de vez; uma comunidade que no passado recente era pujante; tinha uma escola em que 200 alunos a frequentavam. Hoje ela tem somente 6 alunos; somente tem 6 famílias e outras 25 pessoas de idade bem avançada. Toda a juventude e casais jovens foram para as periferias de cidades em busca de algum futuro melhor; em boa parte desta migração deve-se à secas cada vez mais prolongadas e a precariedade de vida que se estabeleceu como consequência.

Na festa da Assunção de Maria, padroeira do lugar, muita gente que migrou para as cidades maiores retorna para as celebrações. Além disto, em torno de 130 jovens desta comunidade e de outras aldeias vão para o internato na cidade de Anzalzano mantido pela paróquia mantida pelos padres esculápios. Vão de ônibus escolares das aldeias aos domingos à tarde ao internato e regressam nas quintas-feiras de tardezinha.

Praticamente, nestas aldeias, sobretudo em QUIRIRIA, não chove mais. Rios e riachos totalmente secos; pontes sobre rios e riachos com tão somente pedras nos leitos e galhos de árvores secos. Alguns eucaliptos e pinus ainda resistem teimosamente; da vegetação nativa, alguns arbustos pequenos similares como as que vemos no cerrado brasileiro é o que ainda resta.

Não conseguem produzir quase nada devido a mudança climática brutal. Era, outrora, uma comunidade em que as pessoas viviam num bom nível econômico, com produção de maça e horticultura pujante.

Fizemos uma celebração marial muito bonita. O silêncio no local é uma tônica impressionante. Não vimos pássaros. O silêncio foi quebrado pelo relincho de um jumento. Toda a comunidade, os moradores, se fizeram presentes, inclusive 5 das 6 crianças que vivem nesta aldeia . Falam a língua quéchua; estendem o espanhol, mas não falam este idioma. Foi uma experiência de inculturação real.

No almoço, nos reunimos todos na quadra de esportes da escola (muito bem construída, mas desocupada, pois não há crianças e nem jovens). Para minha surpresa, eles, como também nas outras partes, não usam talheres para se servirem na refeição. Vai tudo com as mãos mesmo. Por exemplo, tínhamos levado uma porção de macarrão: as pessoas, e nós igualmente tivemos que nos adaptar, nos servíamos, retirando da vasilha o macarrão com as mãos e comer.

Acho que agora, comecei verdadeiramente o meu processo de inculturação. Foi uma experiência emocionante e me tocou profundamente o coração.

Na cidade, Cochabamba e outras, tudo é bem diferente. Nos dizem que no interior da Bolívia, na roça, é igual por todas as partes estes hábitos.

Que lição, que aprendizagem, de simplicidade… Gente com o rosto marcado pelo sofrimento, pelas condições climáticas severas, mas ainda assim alegres, felizes, acolhedores. A nossa visita-celebração-peregrinação foi um fato notável para eles. Largaram seus trabalhos para estar conosco o tempo todo. Muito diálogo e troca de experiências vividas, sempre com a mediação do Pe. Justino que fazia as traduções. Uma integração impressionante ocorreu. Quando embarcamos na van para regressar estavam todos sentados nas escadarias do pequeno santuário nos saudando, como quem diz: voltem de novo, pois assim temos mais vida e nos alimentam a esperança!

Regressamos no final do dia muito agradecidos pela acolhida tão significativa. Ao mesmo tempo carregados com muitas inquietações, interrogações e impotentes diante do quadro real que vimos e testemunhamos. É preciso se importar com eles, ao menos com nossa presença. Creio que o pouco que fizemos com nossa presença é ao menos um pequeno alento e fio de esperança para eles.

Se alguém vai para o céu, estes estão entre os primeiros.

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Bolívia, 21 de junho de 2023
Ir. Inacio Nestor Etges

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