10 de novembro de 2012 CASA GERAL

?Evangeliza-se, principalmente, por contágio… Evangelizar com a vida

Esta entrevista foi realizada por José Manuel Vidal e publicada, em 29 de outubro de 2012 em periodista digital.com, em espanhol. Nela o Ir. Emili fala sobre sua participação no Sínodo dos Bispos, como auditor. O Sínodo aconteceu no Vaticano, de 7 a 28 de outubro de 2012 e teve como tema "A nova evangelização para a transmissão da fé cristã”.

José Manuel Vidal: O que sentiu neste Sínodo que foi quase um miniconcílio?
Emili Turú: Creio ser uma graça ter podido participar de um acontecimento como este. De uma parte, a experiência de internacionalidade é muito rica, embora não seja nova para mim: participo, há 11 anos, do Governo geral de um Instituto presente em 80 países dos cinco continentes. De outra parte, o Sínodo oferece uma vivência eclesial única: pode-se tocar a riqueza da diversidade que trazem os bispos provenientes de tantos países. O mesmo digo de alguns sacerdotes e representantes da vida consagrada ou do laicato. Além disso, nesse caso, temos tido uma presença ecumênica muito importante, através dos 13 “delegados fraternos”, entre os quais estava uma senhora bispo, vice-presidente do Conselho Metodista Mundial.
O Papa, em breves palavras ditas espontaneamente, no fim do Sínodo, qualificou essa Assembleia de “espelho da Igreja universal”, e acredito que muitos assim o sentiram.

Qual é o papel dos auditores?
Os auditores são pessoas convidadas ao Sínodo e, não sendo bispos, participam de modo distinto. São convidados a expressar-se a partir da própria experiência de vida e, portanto, contribuem para a reflexão com outro olhar, talvez com outros pontos de vista ou perspectivas. Como é normal, por não serem bispos, não votam nas decisões tomadas pelo Sínodo.

A escassa presença feminina na aula sinodal chama a atenção.
Também aqui o Sínodo foi “espelho da Igreja universal”, no sentido de refletir o que ocorre em nível local ou diocesano… Na aula sinodal falou-se do papel importantíssimo que desempenham as mulheres na vida da Igreja, onde elas são maioria, mas creio que todos estão conscientes de que a realidade estrutural, que hoje temos, limita sua participação.

Também surpreende (positivamente) a liberdade com que se expressam os sinodais.
A mesma configuração da aula sinodal, em estrita ordem jerárquica, é muito imponente, e faz com que cada um pense bem o que vai dizer ou não vai dizer… Por isso mesmo, é positiva a liberdade com que alguns se expressaram, tanto na aula sinodal quanto nos grupos linguísticos.

Qual foi a intervenção que mais o impressionou?
Bom, que eu lembre… por exemplo, aquela do Arcebispo de Atenas, justamente por sua liberdade de espírito. Ou a intervenção do Arcebispo de Manila, convidando à humildade… Enfim, poderia destacar uma série por diversos motivos.
Mas sublinho de modo especial a intervenção do Primaz da Igreja anglicana, que falou longamente, sem o limite dos cinco minutos de que dispunham os sinodais, sobre o que considero um excelente programa de nova evangelização. Uma proposta profunda, em sintonia com a sensibilidade dos homens e das mulheres de hoje, além de muito realista.

Para que servem essas reuniões, ou não podem ser medidas com critérios de utilidade?
Tenho a impressão que a organização do Sínodo está direcionada para uma realidade: é preciso terminar com uma série de documentos elaborados. Trata-se da “relatio” e, sobretudo, da mensagem e das propostas que são passadas ao Papa para a elaboração da correspondente Exortação Apostólica. Tudo, pois, é orientado para que se chegue à conclusão do Sínodo com esse trabalho feito, e isso é muito, tendo em conta que se trabalha com línguas diferentes. Reconheço que o trabalho de organização e de secretaria é formidável. A metodologia, acredito, é condicionada por essa finalidade, e isso faz com que os temas sejam tratados de modo muito geral, sem aprofundá-los realmente.

Para que serviu este Sínodo?
Em primeiro lugar é preciso dizer que conseguiu produzir os documentos esperados… mas, sobretudo, me parece, ele confirmou que a grande maioria do episcopado está em sintonia com as linhas mestras traçadas pelo Vaticano II: visão esperançosa do mundo; abertura ao diálogo; a Igreja como comunidade “samaritana”; a primazia dos excluídos; a necessidade de começar a evangelização trabalhando a própria conversão, etc. Considerado o momento atual da Igreja, acredito que essa primeira mensagem já é em si positiva. Algumas vozes que ressoam como de “profetas de calamidades” não constituem maioria, mesmo se muito ouvidas. Penso que os frutos de uma reunião desse tipo estão muito ligados ao processo seguido e, como já afirmei, neste caso tudo permanece num nível bastante geral.

Esperava-se algo mais na “Mensagem ao Povo de Deus” sobre os divorciados que tornam a casar.  O tema ainda não está maduro?
Este é um caso muito claro desses aspectos que poderiam ter sido aprofundados, uma vez que era detectado claramente como um caso problemático. A metodologia fez com que fosse tratado de maneira rápida e, portanto, o que se disse foi muito geral.

Que atitudes o senhor vê necessárias para avançar na nova evangelização?
Algumas pessoas criticaram o próprio título do Sínodo, especialmente falar em “transmitir a fé”, porque lhes parecia excluir a dimensão do diálogo. A mim parece um termo sugestivo porque penso que se evangeliza, principalmente, por “contágio”… Evangelizar com a vida e, se preciso, com palavras. Creio, pois, que primeiramente é necessário deixar-se evangelizar pelo Espírito Santo…
Por outra parte, uma atitude que muitos sinodais recordaram foi a humildade que se traduz na capacidade de silêncio e de escuta atenta, fundamentais para o diálogo genuíno. Além disso, aceitar nossas próprias fraquezas, e ser capazes de reconhecer os próprios erros. Destacaria também a necessidade de criatividade. É interessante que, no “Instrumentum laboris”, a palavra criatividade não aparece… ao tratar de uma evangelização que deve apresentar-se NOVA! Uma assembleia tão universal e tão diversa não podia dar fórmulas válidas para todo o mundo, por isso acredito que a criatividade deva incrementar-se em nível local.

No Ocidente, as escolas católicas estão se convertendo no lugar quase exclusivo em que as jovens gerações entram em contato com a fé e a prática religiosa?
O Bispo Drennan, da Nova Zelândia, disse na aula sinodal que, em países secularizados que contam com uma rede de instituições educativas católicas, estas se converteram em “comunidades primárias de fé”. Dizia que ali quase todos os batizados encontram, pela primeira vez e de modo sistemático, a pessoa de Jesus, a oração, a liturgia e a vida sacramental da Igreja. E acrescentou: “os professores, mais que os padres, tornaram-se, em muitos casos, os primeiros formadores de nossos jovens na fé”.
Foi ele mesmo quem disse uma frase, depois aproveitada numa das proposições: “as escolas católicas não são produtos, mas agentes da missão da Igreja”. Com efeito, muitas famílias talvez nunca se aproximem de uma paróquia, por motivos variados; no entanto, confiam-nos a educação de seus filhos, em geral cheias de boa vontade e com atitude de abertura. Essa é uma grande responsabilidade e, evidentemente, um enorme desafio.

Quais são suas “receitas” para conectar novamente com os mais jovens?
A imagem com que inicia a Mensagem do Sínodo é excelente: o diálogo de Jesus com a mulher samaritana. Daí se pode intuir uma série de atitudes fundamentais: sentar-se ao lado, ou seja, gastar tempo com eles; escutar com autêntico interesse, num diálogo que parte da vida real; a acolhida incondicional, sem julgar nem condenar; convidar a confrontar-se com a própria vida e a refletir sobre o que se faz com ela, sem oferecer respostas pré-fabricadas.
Jesus se encontra com uma pessoa marginalizada por ser mulher, pecadora e samaritana; a acolhida incondicional de Jesus faz com que surja uma “evangelizadora” que vai anunciar a novidade de Jesus a seus conterrâneos.

O fato de os Maristas – que o senhor dirige – serem Irmãos pode torná-los mais aptos a sintonizar com o povo?
Durante o Sínodo, cada vez que se nomeava alguém, utilizavam-se todos esses títulos como “Eminentíssimo”, “Excelentíssimo”, “Reverendo”… mas, encantou-me que para os “Irmãos” não se lançou mão de nenhum acréscimo: foi o caso do prior de Taizé, depois do Ir. Álvaro, Superior geral de La Salle, e para mim mesmo.
A palavra “irmão” indica uma relação de horizontalidade, entre iguais. Isso me parece profético, tanto em nossa sociedade quanto na Igreja, onde, por vezes, ocorre certo clericalismo, como reconheceram alguns sinodais. Em nosso caso como maristas, ainda mais, sentimo-nos chamados a contribuir na formação do “rosto mariano da Igreja”, o que sublinha que contribuímos para a vida da Igreja não apenas pelo que fazemos, mas, sobretudo, pelo que somos.

Alguns títulos

  • Creio que é uma graça ter podido participar de um acontecimento como este.
  • Pode-se tocar a riqueza da diversidade trazida por alguns bispos provenientes de tantos países.
  • A realidade estrutural, que hoje temos, limita a participação das mulheres.
  • É muito positiva a liberdade com que alguns se expressaram.
  • A intervenção do Primaz da Igreja anglicana constitui um excelente programa de nova evangelização.
  • Pela metodologia, os temas são tratados de modo muito geral, sem poder, realmente, aprofundá-los.
  • O Sínodo confirmou que a grande maioria do episcopado está em sintonia com as linhas mestras traçadas pelo Vaticano II.
  • Algumas vozes que ressoam como de “profetas de calamidades” não constituem maioria, embora sejam muito ouvidas.
  • Evangelizar principalmente por “contágio”… Evangelizar com a vida.
  • Destacaria também a necessidade da criatividade.
  • Muitas famílias talvez nunca se aproximem de uma paróquia; no entanto, confiam-nos a educação de seus filhos.
  • Com os jovens, acolhida incondicional, sem julgar nem condenar.
  • A palavra “irmão” indica uma relação de horizontalidade, entre iguais. Isso parece-me profético, tanto em nossa sociedade quanto na Igreja.

periodistadigital.com

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Outra entrevista do Ir. Emili sobre o Sínodo – ZENIT
Mensagem do Ir. Emili ao Sínodo

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