Entrevista com o Irmão Chinna e com Víctor (postulante) em Trichy (Índia)

07.08.2003

O ESPÍRITO ORA EM NÓS.

Ir. Lluís Serra

O Ir. Chinna, 46 anos, é o Superior do setor marista da Índia. Víctor é um candidato marista pronto a partir para o pré-noviciado. Tem 24 anos e é de Karayur em Tamil Nadu. Antes de ingressar na congregação marista, estudou na universidade e trabalhou como contador.

O ocidental sonha viajar para a Índia, seu país, em busca de inspiração espiritual. Qual é o segredo?
Chinna: O ?segredo? da vida humana que os místicos hindus descobriram há três mil anos é que Deus, além de estar no céu, ?está dentro de nós?. Isto levou à prática da busca espiritual ativa mas através da meditação que do rito religioso. Há uma longa tradição de ?gurus? da vida espiritual, incluída a atual geração de ?santos vivos?. Os mestres de yoga são um claro exemplo desta tradição. Buscam a paz interior e, fundamentalmente, a união com Deus através do domínio das energias corporais. Os ocidentais que realizam esta busca espiritual visitam e residem nos ?ashrams? ? tanto hindus como cristãos – que põem o pivô na meditação e na vida simples. São alguns dos motivos pelos quais os ocidentais vêm ao nosso país e, alguns de nós riem-se quando os vemos vestidos com suas túnicas de cor açafrão.

Víctor, imagino-me que aqui, aos Irmãos e para ti, será relativamente fácil meditar e cultivar a vida interior. Nos poderias dar algum conselho sobre como se pode melhorar a vida interior?
Certamente há aspectos de nossa cultura que contribuem para estimular e desenvolver a vida interior. Contudo, não se pode pensar que todos os Irmãos praticam diariamente o yoga e a meditação transcendental. Na Índia, como em todo lugar, é o Espírito o que ora em nós. As técnicas de meditação são meramente um meio para alcançar um fim: um nível mais alto de consciência, de harmonia entre corpo, mente e espírito, para despojar-se do ego e abrir-se ao amor de Deus. Necessita-se, primeiramente, conseguir uma vida equilibrada, a pacificação do espírito e um certo grau de ascetismo. Na oração, a postura corporal, a respiração rítmica e a recitação dos ?mantras? nos podem ajudar a conseguir a paz do espírito.

A Índia é um país de contrastes; por um lado, é um país tecnologicamente avançado que possui a bomba atômica, e por outro, encontram-se enormes aglomerações de pobreza. Como é possível que coexistam estas duas realidades aparentemente contraditórias?
Víctor: Na Índia, como em tantos outros países, aparecem os dois extremos. A pobreza prolongada em que vive grande número de nossa gente se deve a muitos fatores: corrupção, baixo rendimento da produção agrícola, um clima desfavorável, um governo interessado unicamente em seu próprio benefício, uma enorme população que disputa os recursos e as oportunidades que se oferecem, etc. O fato de ter ou não uma bomba atômica não muda a realidade em que vive a maioria das pessoas; mas temos uma força militar grande e onerosa. Ainda que seja triste dizer, a defesa continua sendo uma prioridade nacional. China e Paquistão lutaram contra a Índia por questões fronteiriças e ambas são potências nucleares. Assim é que havia uma necessidade para desenvolver uma força nuclear persuasiva indiana. Além disso, nosso país possui uma das maiores concentrações de técnicos de informática do mundo; por tanto, nunca se pensou que não se poderia fazê-lo e havia capacidade para tanto.
Chinna: Para um país que passou um dilatado período sob o domínio colonial, possuir a capacidade de produzir a bomba atômica é um motivo de orgulho nacional. Num país tão grande e diverso como a Índia, há muitas contradições e se confundem as prioridades.

Com uma população superior a um bilhão de habitantes, da qual só 2,3% dela é cristã, que dificuldades enfrentais por pertencer a uma minoria tão reduzida?
Chinna: De modo geral, e sobretudo nas aldeias, há uma harmonia comunitária entre as pessoas de diferentes crenças religiosas. Contudo, nos últimos anos, um movimento chamado ?Hindutva? está promovendo a idéia de que para ser um autêntico indiano precisa-se professar a religião hindu; e os outros que se retirem! Este movimento foi considerado fascista. Promovem a idéia de que a Constituição outorgou demasiados privilégios às minorias em prejuízo da maioria.
Victor: O partido político associado à este movimento está no poder em nível nacional e em alguns estados, de maneira que podem mudar o ambiente em que vivemos. Para dar um exemplo: só no último ano, no estado de Tamil Nadu, donde são os Irmãos, aprovou-se uma lei anti-conversão que procura controlar as conversões ao Cristianismo e ao Islamismo, particularmente de mulheres e ?dalits?, pessoas das castas baixas.

Como iniciou a vida marista na Índia ?
Chinna: Foi o senhor Louis Joseph, um leigo, o ?fundador? dos Irmãos na Índia. Inspirado pela amizade e pelo espírito de alguns Irmãos de Sri Lanka com os quais havia estudado na universidade de Trichy nos anos sessenta, recrutou quatro jovens para os Irmãos, que constituíram uma comunidade em Trichy em 1974. No início e até os distúrbios civis ocorridos em Sri Lanka nos princípios de 80, os maristas indianos eram membros da Província de Sri Lanka.

Os Irmãos possuem uma escola primária e secundária em P. Udayapatti e uma pequena escola secundária perto de Dindigul, ambas em Tamil Nadu. Quais são os que acorrem às vossas escolas e que lhes ofereceis ?
Chinna: Fez-se uma opção consciente de trabalhar com a população das áreas rurais isoladas assim como com os grupos socialmente desfavorecidos. Isto o pudemos fazer porque o governo paga alguns dos professores e assim se podem manter mensalidades baixas. O universo escolar é 85% hindu, 10% muçulmano e 5% cristão. A maioria das crianças provêm de famílias de granjeiros modestos, de artesãos, de pequenos comerciantes e de diaristas sem terra. Todo dia, um bom número de estudantes recebe comida gratuitamente ao meio-dia, oferecida pelo governo. Muitos estudantes continuam depois seus estudos superiores ou seguem cursos contábeis. Ademais, a escola de PU, dispõe de um centro anexo de formação profissional para jovens que deixaram a escola muito cedo.

Víctor, o que em Cristo e em Marcelino te atrai a ti e aos jovens da Índia, e vos leva a escolher nossa vida marista ?
A juventude cristã indiana crê que Jesus é nosso irmão. Para nós, Jesus é o amor, a paz, a felicidade, a misericórdia, a compaixão; como revolucionário, é simples, pacífico, humilde e dócil. Cremos que Jesus é realmente Deus e homem. Tentamos imitá-lo e entregar-nos a Ele. Vemos em Marcelino uma pessoa trabalhadora que nos mostra simplicidade, espírito de família e uma grande devoção à Maria. Ele inspirou aos Irmãos a difundir uma educação cristã, a trabalhar nas áreas rurais e a ter uma preocupação e um amor preferencial pelos pobres. Há tantas pessoas assim na Índia! Destacou a necessidade de tratar a todos igualmente e a respeitar a todos os grupos de pessoas. Esta é uma necessidade especial em nosso país onde há ainda elementos do antigo sistema de castas.

Como estão aplicando os Irmãos da Índia o apelo do Capítulo geral de dedicar-se às crianças e jovens mais pobres ?
Chinna: Mantendo nosso compromisso com os grupos socialmente isolados e desfavorecidos. Somos poucos e não é fácil fazer isto. Também nos deparamos, às vezes, com desafios reais e se precisa fé e valor para perseverar no trabalho.
Víctor: Hoje, os Irmãos estão pensando criar um centro de acolhida para crianças afetadas pela AIDS.

Que futuro espera a presença marista na Índia ?
Chinna: A messe é grande e os operários poucos. Temos esperança num crescimento continuado. Há 20 Irmãos professos hoje, 11 deles na etapa de pós-noviciado. Todo ano, podemos contar com novos candidatos. Agora, começamos a recrutar candidatos fora de Tamil Nadu, em outros Estados da Índia, com o objetivo de levar também ali nossa presença no futuro. Mas, não esquecemos do Se o Senhor não constrói a casa?

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