O Irmão Dionisio Condado, 91 anos, decano da Província marista da China

11.04.2003

A ALEGRIA É O SEGREDO DE VIVER TANTOS ANOS

Ir. Lluís Serra

Dionisio Condado, 91 anos, nasceu em Santurde (Burgos, Espanha), pertence à Província marista da China, da qual atualmente é o decano. Trabalhou em Tianjin e em Hong Kong (China), Kobe (Japão), Cingapura e Malásia. Hoje, desde 1970, é membro da comunidade marista de Hong Kong e colabora no San Francisco Javier College. Realizamos a entrevista na sala de sua comunidade. Esteve muito atento às minhas perguntas e as respondeu prontamente e com claridade.

Sabe você que com a barba que tem se parece realmente a um chinês?
Uma vez, perto de Pequim, em 1937, no escolasticado, fui seqüestrado durante quarenta e oito dias por uns bandidos. Não podendo barbear-me, fiquei com a barba e assim até hoje. Pegaram dois capelães e seis Irmãos. Queriam armas como resgate, mas não tínhamos nem dinheiro e nem armas. Ao darem-se conta que não havia possibilidade de obter nada, nos liberaram. Chegamos a conversar muito com eles e nos tornamos amigos.

Receou em algum momento por sua vida?
Não, apesar de nos terem ameaçado várias vezes, inclusive com a morte.

Como lhe ocorreu de vir à China?
Éramos 10 em casa, quatro meninas e seis meninos, um dos quais era Irmão marista. Eu também o queria ser. Depois de insistir, consegui tornar realidade meu sonho aos 11 anos. Quando nos formularam, no seminário, a pergunta de quem queria partir para as missões, eu me apresentei e aos 12 anos fui a Grugliasco, Itália, para um período de formação.

Quando chegou?
Embarquei em Gênova. Vim com outros Irmãos. Chegamos a Shangai depois de 28 dias de viagem, em 22 de novembro quando eu completava 19 anos.

Isto sim que é uma aventura…
Isto era para sempre. Podia-se retornar, bem, mas podia-se ficar sempre até a morte.

Seus pais como reagiram?
Não se opuseram. Eram bons cristãos. Disseram-me: ?Se este é teu desejo, vai?.

Seu primeiro trabalho na China…
Dar aula. As aulas então eram dadas em inglês, já que se tratava do São Luis, um colégio internacional em Tianjin.

Depois de tantos anos na China, que mais admira na sua gente e cultura?
A gente é muito amável, muito cortês, muito trabalhadora, muito religiosa. Encantam-me as artes chinesas, como a pintura, a escultura, os templos…

Por que foi ao Japão?
Em 1951 abriram uma escola em Kobe e eu fiz parte do grupo que a iniciou. Um sacerdote queria começar este colégio, mas como conhecia os Irmãos, nos convidou a dirigi-la. No princípio, havia poucos alunos mas em pouco tempo a escola ficou lotada. Estive ali seis anos.

E quando veio a Hong Kong?
Após passar um ano de espiritualidade, em Roma, vim a Hong Kong onde pedi para lecionar. Fui mestre de noviços em Cingapura, durante quatro ou cinco anos. Depois fui para Kuching, Sarawak, Malásia.

Quais as melhores lembranças que você guarda como educador marista?
Uma de minhas maiores satisfações é ver meus antigos alunos, como progridem na vida e como a formação recebida lhes permite abrir um caminho de realização pessoal e profissional.

Você viveu em países onde o catolicismo é minoria. Que isto significa ?
Depois da II Guerra Mundial havia muitas conversões porque buscava-se uma espiritualidade. Agora que há muito dinheiro, as pessoas afastam-se mais facilmente da religião.

Como se pode educar para o cristianismo quando uma pequena parte é católica?
A Igreja católica goza de prestígio e suas escolas são muito cotadas e valorizadas pelas famílias. Ensinamos a Bíblia nos primeiros anos e também ensinamos ética.

Você dialogou com budistas, confucionistas, taoístas, muçulmanos e pessoas sem religião…
Sempre me interessei pelas outras religiões; normalmente são respeitadas. Uma vez perguntei a uma criança se havia pensado em tornar-se religiosa. Hoje está num seminário salesiano.

O que mais o ajudou a perseverar como Irmão marista?
O noviciado foi uma excelente experiência; tivemos um mestre de noviços extraordinário. Li muito sobre vocação. Esta impressão ficou comigo. Sempre me senti feliz em ser marista e integrei comunidade muito alegres e com bom espírito.

Caso um jovem lhe dissesse que gostaria de ser como você Irmão marista, que lhe responderia?
Que seria muito feliz, que teria uma vida muito alegre, que estaria a serviço da juventude e que ganharia o céu e a terra.

Porque você crê que hoje custa tanto aos jovens aceitar ser religioso?
Converter-se é um problema já que há tanta diversão, a qual lhes impede pensar em sua vida interior.

Como viu a evolução do Instituto marista desde sua juventude até hoje?
Por vezes ouvi: ?Tudo se acabou! Não viveremos muitos anos…!? É melhor que te cales. Há mudanças na Igreja que alguns não puderam assimilar.

Você vê com esperança o futuro marista?
Estou certo, há altos e baixos mas sempre há algo de novo. Depende de nós.

Quantos superiores gerais você conheceu diretamente?
Os Irmãos Seán, Benito, Charles, Basilio, Charles-Raphael, Diógenes, Estratônico…

Oito sobre 12, não é nada mau. Que pode trazer para o Instituto marista um Irmão idoso?
Dar o bom exemplo

Vejo que você é organista da paróquia, trabalha um pouquinho no colégio ajudando a fomentar a leitura entre os alunos. Mantém-se todavia ativo.
Desde que tive um ataque cardíaco, tenho que me cuidar um pouco.

Como viveu você a canonização de são Marcelino?
Aqui a vivemos muito bem. Tivemos uma missa solene na catedral. No colégio foi um momento muito especial junto com a outra escola marista da cidade. Depois de tantos anos de novenas para pedir a canonização, todos nos sentimos muito felizes. Inclusive os professores não católicos pediram ao diretor do colégio para ter mais coisas católicas já que somos uma escola católica.

Que relacionamento tem você com os professores leigos?
Quando encontro um professor falamos como amigos.

Que representa para sua vida a figura de Maria, a Boa Mãe?
Como maristas, é verdadeiramente nossa Boa Mãe, faz parte de nossa espiritualidade. Nas festas, nos parece natural falar da Virgem. A sentimos profundamente. Com os alunos que querem, durante o recreio, rezamos o rosário. Uns poucos vêm cada dia e mais nas festas. Dois Irmãos os acompanham mas são eles mesmos que dirigem a oração e nossa presença os ajuda um pouco.

Irão construir um edifício anexo de seis pisos… mas quem o financia?
O governo paga a construção e os professores. Os alunos complementam com alguma quantia.

Nascendo você de novo, tornaria a ser Irmão marista?
Por que não? É inútil pensar. Sou o que sou, nada mais… Estou contente com o que sou e o que faço.

Em sua comunidade atual há dois chineses, dois malaios, um alemão e você, espanhol. Como se integram quatro culturas entre seis pessoas?
Muito fácil. Somos maristas e esta é nossa nacionalidade. Estamos muito contentes com nossas comunidades e reina um excelente espírito.

Sente saudades de voltar para a Espanha?
Já a deixei completamente… Nem pensar. A última vez foi em 1983. Tenho ali uma irmã, em Madri, com 96 anos. Nos comunicamos alguma vez.

Que representa para você ser o decano da Província marista da China?
Um estorvo. Que importa ser o decano? Isto não é significativo. A gente tem boa vontade mas que me deixem em paz.

Então lhe molestei entrevistando-o como decano?
Não, em absoluto.

Mas agora vai inteirar-se todo o mundo quando aparecer no Boletim marista…
Isso é o pior. De mim que se fale o menos possível.

Tem boa saúde atualmente?
Não é muito boa, já que tenho que cuidar do coração, mas pode passar. Mentalmente estou bem, ainda que por vezes a memória claudique.

Qual é o segredo de viver tantos anos com tão grande qualidade de vida?
A alegria.

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