9 de dezembro de 2013 CASA GERAL

Ubuntu: nos humanizamos por meio dos demais

Na África existe o chamado UBUNTU. Tem a ver com a essência do ser humano, é parte do presente que a África dará ao mundo. Abarca a hospitalidade, o cuidado dos outros, o ser capaz de qualquer coisa para o bem dos demais. Cremos que uma pessoa é pessoa por meio de outra pessoa, que minha humanidade está enlaçada, conectada com a tua de maneira indestrinçável (Arcebispo Desmond Tutu).

________________

Cada vez que estive na África me impressionou a extraordinária capacidade de acolhida de sua gente. Aonde quer que vás, te encontras com gente caminhando, que responde à tua saudação com simpatia, erguendo as mãos, com as palmas voltadas para ti. Para mim é um sinal muito lindo de hospitalidade, como a dizer: “Bem-vindo; te acolho de braços abertos. Como vês, nada escondo nas mãos; só quero teu bem”. 

Para os que provêm de culturas em que se rende culto ao individualismo, surpreende essa maneira de entender a vida, e faz pensar em valores sociais que foram postos de lado, muitas vezes superados pela necessidade compulsiva de acumular bens e protegê-los, como também pelo egoísmo autorreferencial, bem escondido atrás do inquestionável direito à "liberdade pessoal". 

Natal nos recorda o caráter divino de toda pessoa humana, visto que o Filho de Deus com sua encarnação se uniu, de certo modo, a todo o homem (Concilio Vaticano II). Sabemos que somos habitados pelo Mistério e, portanto, compartilhamos o mais essencial de nossas vidas, que se manifesta em forma de bondade e amor. Assim o reconhece Nélson Mandela em sua autobiografia: Sempre soube que na profundeza do coração humano existe misericórdia e generosidade. Ninguém nasce odiando outra pessoa por causa da cor de sua pele, sua origem ou sua religião. As pessoas têm que aprender a odiar, e se pode aprender a odiar, também se lhes pode ensinar a amar, visto que o amor brota mais naturalmente do coração humano que seu oposto. Inclusive nos momentos mais horríveis da prisão, quando a resistência chegava ao seu limite, podia ver uma chispa de humanidade num dos guardas, quiçá por um segundo, mas suficiente para me animar e continuar. A bondade humana é uma chama que se pode esconder, mas jamais apagar.

Sim, nossas vidas estão estreitamente interconectadas de maneira misteriosa, porém real. Justamente por isso, os participantes da Conferência Geral de setembro passado em N.D. de l’Hermitage, se deixaram interpelar pela realidade de meninos e jovens, particularmente dos que se encontram em situações de maior vulnerabilidade em diversas partes do mundo. Convencidos da atualidade de nossa vocação para uma fraternidade universal, reafirmamos nosso empenho de serviço e disponibilidade sem fronteiras, aos pés de Nossa Senhora de Fourvière. 

Por outra parte, nossa opção de viver em comunidade expressa visivelmente nossa conexão e interdependência. Assim o entenderam nossos mártires, recentemente beatificados, quando decidiram compartilhar a sorte de seus Irmãos de comunidade, inclusive tendo possibilidades de evitar a morte.  

Creio ademais que a próxima celebração da Assembleia Internacional da Missão Marista em Nairóbi (Quênia), como conclusão de um processo desenvolvido conjuntamente por Irmãos e Leigos dos cinco continentes, nos permitirá experimentar de maneira concreta o significado de Ubuntu, para depois aplicá-lo em nossa vida cotidiana. 

Outra oportunidade para viver profundamente nossa dimensão internacional será o processo que nos levará até a celebração do Bicentenário Marista, no ano de 2017. No dia 28 de outubro de 2014, aniversário do encontro do P. Champagnat com o jovem Montagne, fator desencadeante da fundação do Instituto, abrir-se-á um ciclo de três anos como preparação a esse acontecimento. A recente inauguração da casa de La Valla renovada, ali onde começou essa pequena comunidade com horizonte universal, nos convida a esforçar-nos hoje por um novo começo, fiéis às origens e à tradição, mas encarnados no hoje e no aqui que nos cabe viver. 

Ubuntu: eu sou porque nós somos. Quer dizer: nos humanizamos por meio dos demais. E justamente porque cada um é parte inseparável do tecido da humanidade, o que um faz ou deixa de fazer tem consequências na vida dos demais.

Por exemplo, vendo os humildes começos em La Valla, ninguém podia imaginar que o Instituto se estenderia pelos cinco continentes e influiria na vida de tantos meninos e jovens. Também foi difícil para muitos imaginar a extraordinária força transformadora que se encerrava naquele filhinho de Maria e José, chamado Jesus. 

Oxalá que a celebração deste Natal de 2013 nos ajude a tomar consciência de nossa interdependência e de nossa responsabilidade em fazer do planeta Terra um mundo mais habitável e fraterno, mais justo e solidário, enquanto celebramos o nascimento de Jesus, que, partilhando plenamente de nossa humanidade, fez mudar de maneira humilde e discreta, muitos aspectos do rumo da História.  

Feliz Natal! 

_______________
Emili Turú, Superior Geral dos Irmãos Maristas

PDF: English / Español Français Português / Italiano / Catalan | Alemão | Holandês

ANTERIOR

André Lanfrey...

PRÓXIMO

Colégio Marista em Mindelheim...