A perseguição

“Um Irmão Marista não deve ter outra política, que a de Cristo!” – Fr. Laurentino

A frase do Irmão Laurentino nos faz compreender o quanto nossos irmãos da Espanha estavam conscientes de que, no horizonte de suas vidas, o martírio se apresentava como algo concreto, e que a subida ao Calvário já havia começado.

Nós gostaríamos de esquecer isso, hoje. Nossa sociedade tornou-se mais tolerante e medimos melhor os horrores que foram perpetrados dos dois lados daquilo que chamamos “A guerra civil Espanhola”. É possível que sejamos também tentados a olhar para nossos irmãos mártires como simples vítimas políticas: assim eram as forças e as violências do momento.

É muito raro que a dimensão política esteja ausente de um martírio. Na morte de Cristo, os atores e as motivações políticas estão fortemente presentes, e João Batista foi decapitado porque uma jovem dançou magistralmente diante de um rei grotesco. É mártir aquele que se mata porque se gostaria de matar Deus, o Cristo, a Igreja e demolir tudo o que o homem constrói e a sociedade organiza em torno dos valores do Espírito.

Os irmãos estavam conscientes de que deveriam evitar a armadilha e o pretexto da política. O Irmão Laurentino lhes escreve em janeiro de 1933: “Agora, mais do que nunca, nós devemos afastar tudo o que é política de nossas casas, como tudo o que pode fomentar divisões e grupos. Que triste espetáculo faria o religioso que se declarasse simpatizante de algum setor político… O religioso, pelo menos um irmão Marista, não deve ter outra política que a de Cristo!”

Aqueles que mataram nossos irmãos, na Espanha, expressaram claramente seu projeto de expulsar Deus do coração do homem e da sociedade; esse foi o resultado do choque de duas visões diferentes: o homem prometeu e o homem na luz de Deus. O testemunho do Irmão Elias Arizu Rodríguez confirma essa explicação: “Eu fui chamado diante dos chefes da revolução para ser expulso da Espanha. Então perguntei a Aurélio Fernández Portela, da F.A.I., Eroles e Ordaz, porque eles nos perseguiam e nos assassinavam. Eles responderam que, pessoalmente, não tinham nada contra nós, mas que nós professávamos ideais completamente opostos aos deles, e que eles queriam exterminá-los. Desse modo, a única razão da morte de tantos Servos de Deus foi o ódio à Igreja e aos seus ministros. Essa intenção é claramente confirmada por um dos chefes da revolução: “Nós nos propomos, em toda a Espanha, mas sobretudo na Catalunha, de acabar com tudo que cheira a cera.” As milícias do Comitê Revolucionário cantam um refrão semelhante para o Irmão Hipólito, diretor da casa das Avellanes: “Você e os seus apressem-se para deixar o mais rápido essa zona. Caso contrário, vocês irão passar por maus momentos; nós não queremos nem religiões nem pessoas religiosas. Nossa religião é a humanidade.”

Os fatos, na sua materialidade, atestam também a perseguição. Entre as sessenta comunidades e estabelecimentos que tínhamos na Espanha em 1936, 44 tiveram vítimas, 11 foram incendiados, outro tanto foi saqueado, e as profanações das capelas e de objetos sagrados não se contam. Se o número dos nossos Irmãos assassinados chega a 172, o dos que conheceram a prisão, a tortura, os insultos, é bem mais elevado. “Logo que o movimento revolucionário teve início em 18 de julho de 1936, as igrejas e conventos foram incendiados, saqueados e devastados; os padres e os religiosos perseguidos até à morte, muitos foram assassinados… e o culto religioso foi totalmente proibido até o fim da guerra, em janeiro de 1939.”

Hoje experimentamos uma forte emoção diante do grande número de mártires na Rússia sob o período marxista, e nos admiramos desses testemunhos silenciosos da fé. Nossos irmãos mártires na Espanha têm o mesmo mérito pelos mesmos motivos. Eles nos dizem como amar e como permanecer fiéis em situações extremas. Exemplos de humanidade e de santidade, eles são um tesouro precioso na nossa Família Marista, eles são nossos intercessores, eles são nossos Irmãos.

A luta que nós conhecemos, hoje, é simplesmente mais silenciosa, mas, nos meios de comunicação e nas leis sociais, ela é confrontada constantemente com duas visões de homem: o homem que não tem outro horizonte que a sua mortalidade absoluta, filho do absurdo, e o homem na luz, filho de Deus, forte na esperança e no amor que liberta; violência quotidiana, sem derramamento de sangue, mas não sem doação de vida.

Um olhar sobre nossos mártires nos ajudará a dar a Deus e ao homem uma resposta audaciosa, integral, fiel, que abre as portas à esperança.