17 de janeiro de 2011 CASA GERAL

De um lugar para Maria no Instituto a um lugar com Maria na Igreja

A Casa geral celebrava a festa de São Marcelino Champagnat. Era sábado, 5 de junho de 2010. Os Superiores decidiram adiantar a celebração de um dia, porque o dia 5 era sábado. Convidaram as Irmãs maristas, as Missionárias maristas e os Padres maristas. Participava também, como convidado à festa, todo o pessoal que trabalha na casa com os Irmãos, e alguns amigos e vizinhos com os quais se mantém relação, há anos: trapistas, Irmãzinhas de Foucauld e Mínimos. Estava para começar a missa, na grande capela. Atraiu-me a imagem de Maria, no conjunto central, devido à iluminação; destacava-se formosa e radiante. A seus pés, Champagnat, ajoelhado, junta as mãos em atitude de oração. Com a festa se toca o mistério e se amplia o mito. Estamos na capela dedicada a Maria. Ela, sentada, ocupa o centro; acolhe o filho em seu regaço, à guisa de trono. Os símbolos descrevem sua maternidade. Jesus menino, sentado e desnudo, encosta a cabecinha contra o coração da mãe; ele preside a cena.Blocos robustos, apoiados nos quatro ângulos das paredes frontais, suportam a cúpula. Recordam os quatro grandes privilégios de Maria: Mãe de Deus, Medianeira, Imaculada e Assunta. À esquerda, próximo ao órgão, em baixo-relevo de terracota, está o anjo mensageiro da Palavra que traz o anúncio a Maria. À direita, em composição escultórica similar, Maria escuta e acolhe o Verbo em seu seio. Entre a representação do anjo que anuncia e de Maria que concebe, enquadra-se a dinâmica espiritual do altar, onde a Palavra é proclamada, celebrada e acolhida, em banquete de irmãos. A Palavra, que se fez carne em Maria, habita entre nós.Pensei que a anunciação a Maria tinha alguma continuidade plástica no conjunto escultural e central da igreja e imaginava alguns capítulos da história de nossas origens. Com efeito, Marcelino, em seus anos de seminário, declarou-se ?escravo de Maria?. Maria é para Marcelino o modelo de fidelidade ao Senhor. E Marcelino, por sua vez, concebe em seu coração, por obra do Espírito Santo, a família dos Irmãos. Essa vivência de nosso fundador aparece-me como uma referencia claríssima ao rosto mariano da Igreja. A vida interior de Marcelino é orientada pela aplicação concreta do princípio mariano da Igreja.Os maristas de Champagnat, Irmãozinhos de Maria, foram concebidos por Marcelino durante o tempo de sua formação no seminário. Esse tempo de formação interior foi um tempo de anunciação. O anjo do Senhor anunciou a Marcelino, como a Maria, e ele concebeu os Irmãos por obra do Espírito Santo. Essa gestação se completa no momento do esvaziamento interior, que dá origem a um seio materno em total disponibilidade, diante da vontade de Deus. A nova célula de Igreja, fecundada pelo carisma marista, é a origem de sua intuição: ?Precisamos de Irmãos?. Então, todos os maristas foram gerados pelo carisma de Champagnat. Nasce assim a Igreja integrada pelos maristas que creem e optam por viver sua fé e sua consagração a Deus, em comunidade de Irmãos.O carisma marista, acolhido com plena abertura no coração de Marcelino, produz um primeiro fruto eclesial: o começo de uma família de crentes que se congregam como Irmãozinhos de Maria. ?Este carisma foi uma graça para Marcelino, um dom especial do Espírito, o fruto de seu próprio discernimento sobre o que Deus lhe pedia. Por meio desse processo foram despertando as intuições que esclareciam e davam um sentido integrador ao que, nesse momento, era o mais importante para ele; uma ideia mais clara do rumo a tomar, a identificação com um modo específico de viver em união com Cristo. Daqui emanava essa força interior – sua própria espiritualidade, – e a orientação para um apostolado centrado na educação cristã dos jovens, em particular, dos menos favorecidos.?(1) Num grupo de seminaristas em que os projetos se concebem orientados, sobretudo, pelo princípio petrino da Igreja, sobressai a atitude de Marcelino que, iluminado por uma intuição inspirada pelo princípio mariano, propõe insistentemente promover a participação dos fiéis leigos como presença imprescindível, no projeto da Sociedade de Maria para que resulte completo. Se faltam os Irmãos, falta algo de essencial no projeto. Sua intuição se expressa na frase ?necessitamos de Irmãos?. Essa atitude existencial de Marcelino, destacando a necessidade de crentes de base, num projeto eclesial suscitado e animado por clérigos, manifesta a profundidade com que Marcelino capta o mistério da Igreja. Podemos afirmar que em sua concepção prevaleceu o princípio mariano sobre o petrino. Numa organização de sacerdotes considerou que os Irmãos eram indispensáveis. Marcelino não elaborou teorias teológicas em torno do princípio mariano nem o conheceu como dado teológico, mas, colocou-o em prática e deu-lhe vida, adiantando-se profeticamente aos tempos futuros.A lógica dessa anunciação, experimentada durante o tempo de formação como seminarista, tem um momento complementar, quando Champagnat dá à luz seu projeto, em La Valla. Entre esses dois extremos cronológicos, adquire perfeita unidade o Nazaré do seminário e o Belém de La Valla. O Nazaré do seminário propõe abundantemente a Palavra anunciadora. O anjo do Senhor se comunica com Marcelino, através da Palavra anunciadora de seus professores, diretores espirituais, confessores e companheiros de seminário. O Logos, o Verbo de Deus, se faz carne no coração de Marcelino.Essa origem eclesial de nosso Instituto marca os Irmãos nos fundamentos da própria identidade. Nascemos na Igreja, da Igreja e para a Igreja, no âmago de um sim que aderia a uma nova encarnação da Igreja, em meio a um mundo desconcertado pela Revolução francesa. Se a primeira célula da Igreja foi Jesus feito homem, mediante o sim de Maria, a fecundidade de nossa vida como maristas ? que dizem sim a Deus ? não pode ser senão uma nova célula de Igreja que introduz a fraternidade no meio de um mundo dividido e afastado de Deus.Aos Irmãos, essa origem, diretamente relacionada com o princípio mariano da Igreja, compromete-os a promover, defender e amar uma Igreja que vive na vanguarda da gestação da fé, em lugares de fronteira, na evangelização e na catequese. A Igreja-mãe concebeu – através do seio materno que fez morada no coração de Marcelino – uma nova comunidade de fé caracterizada pelo ser Irmãozinhos de Maria. Nascidos como clara expressão da maternidade de Maria na vida de Marcelino, a Instituição é um acontecimento destacado no rosto mariano da Igreja. Ser irmãos entre irmãos manifesta uma característica peculiar do rosto mariano da igreja. Fomentar a fecundidade da Igreja, pela difusão da fraternidade entre os homens e mulheres de hoje, torna evidente que o marista faz resplandecer o rosto mariano da Igreja. Viver em fraternidade, onde cabem raças, línguas e nações, é revelar um rosto mariano da Igreja de Jesus.O conjunto escultural da grande capela da Casa geral me apresenta, pois, uma apoteose da anunciação de Maria a Marcelino. O olhar da Mãe depõe a Palavra nas mãos juntas e orantes de Marcelino. A atitude de Marcelino, de joelhos, voltado para a Mãe, em atitude de acolhida e com o olhar para o alto, é a descrição plástica do completo vazio de si, em Marcelino, de sua total disponibilidade, feito seio materno e paterno para que nasça a nova comunidade de crentes, que receberá o nome de Irmãozinhos de Maria. No centro, Jesus ? o Senhor, ? Verbo feito carne nas entranhas de Maria, é quem harmoniza e dá sentido a tudo quanto ocorre. Cinco anjos proclamam a festa interior. Dois são músicos e três, cantores. Anjos da guarda e mensageiros dos cinco Continentes em que deve realizar-se a fecundidade dos filhos de Champagnat. Cinco bocas universais que retumbam um Magníficat pelas maravilhas que Deus realizou em Maria e em Marcelino. Cinco anjos convocam todas as dioceses do mundo onde se faz presente a fraternidade nascida do carisma marista. Cinco testemunhas dos feitos marianos da Igreja, encarnada nos maristas!_________AMEstaúnEste escrito faz unidade com os artigos publicados anteriormente no site.


1. Charles Howard, Circulares T 29 (1990) p. 252

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